Marco Aurélio Raymundo é médico pediatra gaúcho, presidente da Mormaii, empresa líder do segmento de
trajes para esportes náuticos.
Mobilizou a comunidade de Garopaba (SC) promovendo o desenvolvimento social e a responsabilidade social empresarial.
Atraiu a atenção do mundo dos negócios com a estreita relação da sua empresa com a comunidade local, flexibilizando horários de trabalho e concedendo autonomia para os funcionários.
Surfando na onda dos negócios, o médico gaúcho Marco Aurélio Raymundo, 61 anos, foi um daqueles jovens hippies dos anos 70. Ele largou o estilo de vida que tinha em Porto Alegre e foi curtir o mar em uma vila de pescadores em Santa Catarina.
Quase quarenta anos depois, Morongo, como é mais conhecido, virou um empresário de sucesso, inovador e informal, adepto dos óculos escuros, que transformou a Mormaii em uma das principais marcas jovens do País.
Hoje, sua empresa produz uma infinidade de produtos – mais de 600 -, desde trajes de esportes aquáticos a biquínis, óculos, roupas, acessórios e cosméticos, exportando para 50 países.
Morongo saiu de Porto Alegre em busca de qualidade de vida e de realização profissional, o que, para ele, significa também participação social. Em Garopaba, no litoral sul catarinense, encontrou um bucólico povoado sem água encanada e energia elétrica, onde montou o primeiro posto de saúde da região. Apesar de ser pediatra, atendia homens, mulheres e idosos, já que era o único médico na região. No fim do expediente, pegava a prancha e corria para o mar.
Nos primeiros dois anos, sua casa não possuía energia elétrica. O doutor Morongo recebia galinhas e peixes como retribuição por consultas e tratamentos. Como o inverno catarinense era um problema para o surfe, resolveu costurar seu próprio macacão de borracha.
A peça fez sucesso entre surfistas e gerou muitos pedidos de amigos. Assim surgiu a empresa, cujos primeiros funcionários eram pacientes com hanseníase.
A fábrica cresceu empregando os moradores da região. A princípio, os trabalhadores precisaram de treinamento. Por falta de máquinas de costura apropriadas, máquinas de costurar calçados foram adaptadas. Aos poucos, consolidou-se a Mormaii (mistura heterodoxa de Morongo, Maíra, a primeira esposa, e Havaí). Surfistas de várias regiões começaram a comprar os macacões e a encher as praias da Ferrugem e do Silveira, as mais famosas de Garopaba.
Com eles vieram namoradas, famílias e amigos, impulsionando o turismo local – hoje, o motor econômico da cidade de 16,7 mil habitantes, que recebe 40 mil no verão.
A essa altura, Morongo teve de fazer uma escolha: a carreira de médico ou a de empresário. “As doenças eram consequências da falta de infraestrutura e das condições socioeconômicas da região. Percebi que poderia contribuir mais como empreendedor”, explica.
Com o crescimento, a Mormaii tornou-se parte da identidade local. Os vínculos com os moradores permanecem fortes até hoje. Muitos se lembram do tempo em que o surfista vestia bermuda e jaleco branco para fazer atendimentos e distribuía amostras grátis de medicamentos.
Hoje, a empresa tem 220 funcionários diretos, mas considerando as 37 empresas licenciadas da marca e as 27 lojas exclusivas no país, o número de empregados chega a 10 mil.
Compromisso social
Apesar de liderar uma empresa competitiva, que cresce 10% ao ano e se espalha pelo mundo, Morongo não trabalha 15 horas por dia, seis dias ou mais por semana.
Costuma tirar folgas prolongadas e viaja para lugares paradisíacos, como Tailândia e Havaí. Nunca deixou de alternar o escritório com a praia. O segredo? “Eu consigo delegar. Às vezes fico dois meses viajando e encontro a empresa melhor do que deixei. Se você der espaço para as pessoas crescerem, pode se surpreender com elas, porque dar espaço é dar liberdade, e isso induz à criatividade.”
A flexibilização do horário de trabalho é uma marca da Mormaii. Os funcionários têm autonomia para planejar a rotina e, se o mar estiver bom para o surfe, chegar mais tarde ou sair mais cedo para aproveitar as ondas. “É uma pena que as leis trabalhistas não estejam preparadas para esse aumento de consciência, ignorando as rotinas alternativas”, critica. A estratégia de administração chama a atenção de empresários e de estudantes que visitam a empresa.
Morongo é descrito como um chefe onipresente, que em um momento participa de uma reunião para aprovar um novo produto, e, no instante seguinte, ajuda a cortar a grama do pátio. “Um empresa é feita de pessoas. Ninguém é contra dinheiro, mas nenhum dinheiro no bolso tem mais valor do que surfar na hora certa em que rolam altas ondas.
Minha preocupação passa pela qualidade de vida.”
Para resumir sua prática de gestão, nada como a filosofia hippie. “O mundo é dividido entre Yin e Yang. O primeiro é cooperativo, pacifista e conservador. O segundo, agressivo, competitivo e expansivo. O desafio é percorrer o caminho do meio, o equilíbrio, que é o que perseguimos na nossa empresa”, ensina.
Do mochileiro que chegou a Garopaba há 40 anos resta mais que o discurso e a “descontração criativa” adotada na gestão. Morongo esbanja convicção. “A lógica dos negócios é muito voltada para o Yang, mas se eu ficasse só no Yin viveria na praça, vendendo chinelinho de palha, e nunca geraria transformação”, argumenta. O neo-hippie de hoje mora em uma mansão cinematográfica, dá palestras sobre modelos de negócios e viaja pelo mundo em busca da onda perfeita – a próxima.